sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Sobre postes e cadeados de bicicleta


(Justiceiro desenhado por Alonso Espinoza, em Deviantart)

Os melhores tempos são aqueles em que vivemos. E os piores também. As duas afirmações são, por óbvio, verdadeiras, por mais que o mundo se esforce para nos convencer de que apenas a segunda é válida:




Como de hábito, a reação de parte da sociedade aos fatos se revela mais chocante do que os próprios fatos. Eu sei, “não leia os comentários”. Mas parece que está cada vez mais difícil não saber das coisas. Então, meio sem querer acabamos descobrindo que o homo brutus, que ainda pensa ser sapiens, praticamente ignorou a morte da policial, comemorou a chacina no morro, e rejubilou-se com a tortura praticada contra o menor infrator.

Naturalmente, essas reações ensejaram uma série de debates entre os cidadãos "de bem” e o “pessoal dos direitos humanos”. Como se os direitos humanos fossem do “mal”. Essa parte é muito complicada pra minha cabeça, então vou evitar anos de psicoterapia e simplesmente aceitar que algumas pessoas admitem a aplicação de uma boa dose de brutalidade para defender o que elas consideram correto. Vou me abster de julgamentos morais sobre isso, até porque a internet já está repleta deles. Depois, devem ter sido até românticas aquelas épocas em que o homem vivia no fio da espada, ou embalado pelos trovões de um Colt 45. Quem não gostaria de voltar a esses bons tempos?

Mas, enfim, deve haver algum motivo racional para que fuzilamentos e torturas causem êxtase nos cidadãos “de bem”. E o único que posso imaginar, fora o simples sadismo, é a crença de que esse tipo de repressão poderá inibir a criminalidade e, eventualmente, fazer com que nossas cidades se tornem mais seguras. Foi pelo menos o melhor significado que consegui extrair de argumentos profundos e eloquentes do tipo “tá com pena, leva pra casa”.

Como não estamos a fim de discutir preliminares, vamos abraçar o maquiavelismo e partir logo para os fins. Por mais que pareça estranho tentar apagar um incêndio com gasolina, será possível que uma repressão mais violenta possa reduzir a criminalidade?

Infelizmente, não existem (ou, se existem, não encontrei) pesquisas ou dados oficiais que relacionem a ação de justiceiros com a variação dos índices de criminalidade. Talvez porque essas ações também sejam classificadas como crimes. Mas há estudos que associam o endurecimento da repressão e das sanções estatais com os índices de criminalidade. Vejamos alguns exemplos:

- Nos Estados Unidos, em 2004, a taxa média de homicídio nos estados que aplicavam a pena de morte era de 5.71 por 100.000 habitantes, contra 4.02 por 100.000 habitantes nos estados que não a aplicavam;

- Na Califórnia, a média de crescimento anual de homicídios dobrou nos anos em que foi praticada a pena de morte;

- No Canadá, a taxa de homicídio decresceu 44% nos 27 anos posteriores à abolição da pena de morte, entre 1975 e 2003;

- Na Baviera, a taxa de homicídios caiu de 16,4 para 9,41 (por mil habitantes) após a extinção da pena de morte;

- No Brasil, a taxa de crimes hediondos segue em tendência de alta desde a década de 90, inobstante o agravamento das sanções e dos regimes prisionais impostos pela Lei 8.072/1990 e o crescente aumento da população carcerária.

Portanto, o aumento do rigor penal não cumpre o desejado papel de reduzir a criminalidade. Ao contrário, quando o Estado atinge o máximo grau de punibilidade – a pena de morte – o efeito é uma brutalização ainda maior dos crimes.

Para quem não acreditar nessas conclusões, ou quiser se aprofundar no assunto, inclusive tendo acesso a mais dados, recomendo a leitura dos seguintes artigos:





Então, se você descobriu que sente prazer vendo adolescentes acorrentados a postes, aproveite. Ainda não é coisa que se veja todo dia, pelo menos não na zona sul da cidade maravilhosa. Mas não alimente a ilusão de que isso tornará as ruas mais seguras. Na verdade, só aumentam as chances de que você seja o próximo a ter um cadeado de bicicleta em volta do pescoço.

"Para toda ação existe uma reação de força equivalente em sentido contrário". 
(Newton, Isaac)

"Em tudo, faça aos outros o que você quer que eles lhe façam; 
nisto se resumem a lei e os profetas." (Cristo, Jesus, in: Mateus 7:12)

BIILY, GET YOUR GUNS!! (Bongiovi, John Francis)



Nenhum comentário:

Postar um comentário